Diogo Souza

Escritor e jornalista

Saudade do que não viveu


Anemoia: Nostalgia de um tempo no qual você nunca viveu.
        

         “Então você quer escrever?”
“Sim.”
“E por que quer ser escritor?”
“Eu sempre quis escrever, acho até que não escrevo mal por isso decidi procurar consultoria para me ajudar.”
“Isso é bom, e o que escreve?”
“Nada de muito organizado. Na verdade, sinto que quero escrever e escrevo o que vier. Geralmente pensamentos... coisas do tipo.”
“Sentimentos?”, perguntei, sugerindo a resposta.
“É.”
“Então você escreve sobre sentimentos?”
“Às vezes, nem sempre”, ele disse entre uma tosse e outra.
“É excelente ter facilidade para falar de sentimentos, pois é o tipo de coisa que não têm um significado definido, estrito. Por exemplo, a solidão, no dicionário, é um substantivo feminino que se refere ao estado de quem se acha ou vive só. Para mim, solidão pode ser vazio na alma, pode ser incompreensão, a falta de alguém, etc.”
“Que bonito,” me elogiou.
“Obrigado! Agora me diga: quais sentimentos você costuma escrever?”
“Ah, depende do momento, do estado de espírito,” ele riu e olhou para mim, depois para a mesa e o chão como se procurasse as palavras por ali. Por fim, voltou a me olhar e continuou:
“Sobre saudade. Sobre a saudade que se sente em cada momento, sobre o que ela faz com as pessoas. A saudade de sentir algo.”
“De sentir algo?”, perguntei cerrando os olhos, ele riu de si mesmo.
“É... é uma coisa louca. Saudade de sentir algo... Eu vou tentar explicar. Quando vivemos um sentimento nos sentimos preenchidos e plenos. Vivos. Mas quando esse sentimento acaba, ou a fonte dele vai embora, ficamos com aquele vazio que parece ser infinito. Ficamos com saudades. Uma saudade insana, como se algo dentro de nós implorasse que aquela pessoa volte e, com ela, tudo de bom que foi vivido. O tempo passa, a dor diminui e a ferida cicatriza, mas aquele espaço ainda precisa ser preenchido.”
Eu o olhava e ouvia atentamente, mas ele se interrompeu: “Desculpa, eu tô viajando...”
“Não, não está! Continue.”
“Quando aquela ferida se cura, não sentimos mais falta do passado, quer dizer, não sentimos falta de quem nos fez feliz no passado, entende? Na verdade, sentimos falta da sensação de felicidade que se tinha. Então queremos ser felizes de novo, preencher o vazio de sentimentos, mas agora com coisas novas. E queremos essa novidade com a mesma dor e intensidade de uma saudade. Como se sentíssemos saudades de algo que ainda nem vivemos.”
“Porque já sabemos como é a felicidade e queremos este estado de volta,” completei, entendendo e me vendo em cada palavra dita.
“Isso mesmo”, concordou sorrindo com os lábios, talvez orgulhoso do marejar que provocou em meus olhos.
Olhamos um ao outro em silêncio com a sensação de compartilhar o mesmo sentimento, ou pelo menos a falta dele, como bem disse. Peguei seus manuscritos e o dispensei, cancelei meus compromissos da tarde e me dediquei a ler alguns textos com análises pendentes e também a pensar e repensar no que estava acontecendo em minha vida.